Adolescente ou aborrecente? A piada até faz sentido, mas se engana quem
pensa que a juventude só traz ‘aborrecimentos’. Que tal entrar em uma sala de
aula na escola perto da sua casa e descobrir que ali, em uma das carteiras, está
um cientista? E cientista de verdade, que faz pesquisa, vai a campo, inventa,
descobre.
Ou se você é um aluno, que tal você ser o cientista? Já pensou nisso?
Parece difícil? Mas nem é tanto. Uma prova disso foi a Feira de Ciências na
Escola. Nela, foram apresentadas dezenas de pesquisas vindas do Estado inteiro.
Alunos e professores se reuniram em Cuiabá, em novembro de 2014, para mostrar
suas descobertas e frutos do trabalho.
Uma feira de ciências também se torna espaço para desenvolvimento de novas
ideias e possibilidades. Já imaginou alunos do ensino médio saindo do interior
de Mato Grosso para falarem sobre bioindicadores, degradação do pasto,
cromatografia, automação e robótica? Pois esses foram alguns dos trabalhos
apresentados.
O professor doutor
Kilwangy
kya Kapitango-a-Samba, docente da Unemat e assessor da Seduc que coordenou o
evento, afirma que a Feira de Ciências mostra muito mais que trabalhos de
escola. O aluno precisa sentar com o professor, elaborar um projeto, estudar e
desenvolver uma pesquisa de caráter introdutório, o suficiente para experimentar
a produção de conhecimento, com certo rigor metodológico e analítico.
Para Kapitango-a-Samba, feiras de ciência são
espaços para produzir conhecimento.
Foto: Daniel Morita
Segundo o professor Kapitango-a-Samba,
ocorreram outras feiras de ciências, já na década de 1990, em âmbito estadual.
Nos anos mais recentes, outras tentativas de juntar jovens pesquisadores de todo
o Estado acabaram trazendo alguns problemas. Algumas edições da Mostra
Científica, por exemplo, não ofereceram prêmios aos estudantes e professores, o
que causou desestímulo, pois a premiação é uma tradição deste tipo de
evento.
Apesar disso, a
Secretaria de Estado de
Educação de Mato Grosso [Seduc-MT] resolveu, em 2014, reformular a feira,
com apoio do
Conselho Nacional de Desenvolvimento
Científico e Tecnológico [CNPq]. Em 2014, doze trabalhos foram classificados
para ganhar bolsa de iniciação científica júnior e um notebook para cada
professor orientador. A bolsa é um auxílio financeiro para os alunos, que dura
um ano para que ele continue a pesquisar. Além disso, os dois primeiros
colocados ganharam vagas na Feira Brasileira de Ciências e Engenharia, que
acontece em março, em São Paulo.
Para 2015, já está sendo organizada uma segunda
edição da feira, dessa vez com 20 bolsas para os projetos. Confira e se mantenha
informado no blog da
FECEB-MT.
Vencedores
Mesmo com o desânimo causado pela falta de
prêmios nos anos anteriores, a edição de 2014 recebeu muitas inscrições, e
alguns números são interessantes. Dos 61 trabalhos aprovados, 55 vieram do
interior de MT. E de todas as escolas que enviaram trabalhos, apenas uma não era
da rede pública. Além disso, o professor Kapitango-a-Samba ressalta a presença
de dois projetos de pesquisa dos alunos da educação especial.
Para ele, a presença maciça de escolas do
interior pode ser um reflexo da vontade desses alunos. “No interior as
oportunidades, muitas vezes, são menores que nos centros urbanos. Daí que a
vontade de fazer e abraçar uma chance talvez seja maior nos alunos”.
Dois projetos apresentados foram classificados
em primeiro lugar e encaminhados para a mostra nacional, que acontece no próximo
mês, na capital paulista. Um deles é da aluna Deborah Guedes, 16 anos, de Barra
do Bugres. A aluna da escola estadual Alfredo José da Silva conta que a ideia
surgiu com o desperdício de alimentos que acontecia no refeitório da escola.
Junto com a professora Laura Aparecida de Amorim, ela elaborou um questionário
que foi respondido por 104 alunos do ensino médio.
Deborah Guedes (direita), com sua professora
Laura Amorim. De Barra do Bugres, seu trabalho foi credenciado para a etapa
nacional (Foto: Fanpage da escola no Facebook)
Depois de analisar os dados, elas concluíram
que o desperdício também acontece em casa. “A gente achava que acontecia como um
descaso pelo público. Mas vimos que isso, muitas vezes, vem de casa”. Com o
apoio da bolsa que ganhou na feira de ciências, ela pretende agora realizar
oficinas e cursos de práticas alimentares e aproveitamento dos alimentos.
Outro trabalho finalista foi o de Willyan
Araújo, da escola Alexandre Quirino de Souza em Porto Alegre do Norte. Usando
peças compradas ou reaproveitadas, ele desenvolveu um robô para ser usado em
operações táticas da polícia e bombeiros. Willyan conta que aprendeu a lidar com
a mecânica, eletrônica e linguagens de programação sozinho, pesquisando. Com o
apoio das professoras Maria Rosalina e Lucia Eni, ele inscreveu o trabalho na
feira e ganhou o primeiro prêmio.
De Porto Alegre do Norte, Willyan Araújo exibe
experimento que foi classificado à final nacional.
(Reprodução/Agência da Notícia)
A professora Rosalina reforça a importância dos
trabalhos científicos na escola. “É importante para o aluno. Eu incentivo muito
isso, e tem dado resultados bons. Além desse, o município também já foi premiado
em feiras do Instituto Federal de Mato Grosso (IFMT)”. O desafio agora é
aperfeiçoar a pesquisa. Hoje, Willyan estuda no
IFMT, o que deve ajudar na continuidade do seu
projeto.
Segundo conta o professor Kapitango-a-Samba, as
duas vagas para trabalhos na feira nacional foram uma surpresa, e não estavam
previstas no regulamento, nem no orçamento. Por conta disso, a Seduc não pode
auxiliar financeiramente as viagens dos alunos para apresentação dos trabalhos.
Por enquanto, eles ainda estão buscando patrocinadores e colaboradores para os
custos de viagem e estadia. Willyan conta que já recebeu apoio de algumas
pessoas, mas ainda falta bastante. Para a etapa nacional, ele está preparando um
projeto para agricultura de precisão.
Atualmente, Willyan estuda no IFMT e busca
recursos para viabilizar sua ida à etapa nacional.
(Foto: Daniel Morita)
Educar pela pesquisa
Para o professor Kapitango-a-Samba, tanto na
universidade quanto na educação básica é muito importante o trabalho de campo e
a iniciação à pesquisa. “Em termos de produção de conhecimento, o ensino fechado
no uso de lousa e livro didático favorece apenas a reprodução do conhecimento.
Precisamos sair dessa mera reprodução para alcançarmos níveis mais
esclarecedores de como o conhecimento se produz. No mínimo, fazer aulas
experimentais e de reflexão crítica favorece mudanças e gera novas visões no
aluno”.
Ao falar de moléculas ou forças, coisas que não
vemos, fica mais fácil de entender em um laboratório, onde tudo isso vai ser
representado e visto pelos alunos. “Nós saímos do abstrato e vamos para o
prático. Porque o mundo onde vivemos não é abstrato. Ele é concreto, é
prático”.
E, a função do experimento vai além disso. Os
professores e alunos podem descobrir, criar e se transformar em geradores de
conhecimento. E isso incentiva a criatividade dos jovens. “Fala-se muito em
inovação, mas a criatividade é ainda mais importante. O inovador não é sempre
criativo, mas o criativo é sempre inovador”, finaliza o
professor Kapitango-a-Samba.
Imagem de capa: Seduc-MT
Disponível em: <http://www.revistafapematciencia.org/noticias/noticia.asp?id=658>.